O verdadeiro espectro político das criptomoedas descentralizadas
Esquerda, direita ou nenhuma das opções anteriores? Entenda de maneira clara como as coisas realmente funcionam.
Conceitos básicos
Para responder a esta pergunta, faz-se necessário explicar o que é criptomoeda. Os ativos digitais são meios de troca que fazem uso de tecnologia blockchain, podendo ser descentralizados ou não.
De forma resumida, criptomoedas são apenas códigos computacionais criados para serem usados como dinheiro. O exemplo mais proeminente está presente no whitepaper do Bitcoin: uma versão puramente peer-to-peer (ponta a ponta) de dinheiro eletrônico para que pagamentos on-line sejam enviados de uma parte para outra.
Diferentemente dos ativos fiduciários, as criptomoedas descentralizadas independem da existência ou do aval de entidades governamentais para funcionar: os próprios desenvolvedores, em conjunto com a comunidade, são os únicos responsáveis por questões como emissão, uso e desenvolvimento.
Criptomoedas e seu espectro político
Jackson Palmer, cofundador da Dogecoin, revelou os motivos por trás de ter abandonado seu projeto:
“Após anos de estudo, acredito que criptomoedas são uma tecnologia inerentemente de direita, hiper capitalista, construída principalmente para ampliar a riqueza de seus proponentes através da combinação de evasão fiscal, relaxamento da supervisão regulatória e escassez imposta artificialmente.”
- Veja também: Opinião: O 5G não é importante para o metaverso
De fato, a piada virou uma grande oportunidade de investimento de curto prazo para grandes investidores. Elon Musk, dono da Tesla e da SpaceX, é um dos maiores defensores do ativo; durante muito tempo, suas publicações ajudaram a valorizar a DOGE no curto prazo.
Mas Palmer falhou em sua leitura, assim como boa parte dos libertários.
Criptomoedas, por definição, são tecnologias neutras – assim como a internet, que não possui um lado definido. Verdade seja dita, é dentro do universo digital que a humanidade foi capaz de gerar coexistência entre as mais variadas ideologias.
Anarcocapitalistas podem criar mecanismos financeiros sólidos para aumentar sua lucratividade e transacionar sem a ingerência do Estado; socialistas e comunistas podem fazer uso de ativos digitais para gerenciar bens e serviços produzidos por seus pares (confira este artigo); indivíduos “em cima do muro” podem utilizá-las em conjunto com moedas fiduciárias.
Por fim, as criptomoedas descentralizadas não podem ser categorizadas como “ideológicas”, assim como um revólver não pode ser culpabilizado por seu mau uso. A não ser que os desenvolvedores sejam explícitos a respeito do público-alvo pretendido, considerá-las como ferramentas de “direita” ou de “esquerda” é uma grande estupidez.
Considerações finais
Debates ideológicos tendem a complicar coisas simples. A dificuldade de compreender as coisas como realmente é uma consequência do fanatismo dos clubistas. Criptomoedas não fazem distinção de gênero, condição financeira ou crença política; basta adquiri-las e se tornarão sua nova posse.
A maneira como você as utiliza, entretanto, é o que determina a ideologia por trás de suas intenções – não da de seus ativos. Se você é de esquerda e acredita que uma DAO é o caminho para escapar das amarras dos grandes executivos, que seja; se você é de direita e defende a independência incondicional econômica do próximo, que seja; se não for nenhuma das respostas anteriores, que seja, também.
Só não culpem a ferramenta pelo resultado final de sua obra.
Jornalista, trader e entusiasta de tecnologia desde a infância. Foi editor-chefe da revista internacional 21CRYPTOS e fundador da Escola do Bitcoin, primeira iniciativa educacional 100% ao vivo para o mercado descentralizado. Foi palestrante na BlockCrypto Conference, em 2018.