Veterana de Wall Street alerta que incursão da ICE pode levar práticas bancárias nocivas ao ecossistema das criptomoedas
Caitlin Long é uma profissional de Wall Street com 22 anos de experiência, tendo inclusive gerenciado o negócio de pensões da Morgan Stanley. Recentemente, Long escreveu um artigo sobre a “financeirização” das criptomoedas pela entidades de Wall Street, descrevendo a nova iniciativa da ICE (proprietária da Bolsa de Valores de Nova York) de lançar um mercado de Bitcoin, chamado Bakkt, como uma faca de dois gumes.
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Caitlin falou com o site CCN sobre a financeirização das criptos, descrevendo duas faces diferentes deste processo, das quais uma melhora a liquidez por meio de novos investidores, como investidores institucionais, e é benéfica à esfera.
“Em um bom contexto, a liquidez está melhorando porque a base de investidores de um ativo está crescendo — novos investidores estão entrando, especialmente investidores institucionais.”
Comentaristas do ramo das criptomeodas têm aguardando a chegada de investidores institucionais com bolsos fundos o bastante para impulsionarem a capitalização de mercado e, com novos serviços de custódia e outras infraestruturas financeiras tradicionais sendo implementadas, parece que estes investidores estão cada vez mais próximos.
Há, contudo, uma segunda forma de financeirização.
Financeirização e reservas fracionárias
A segunda forma alavanca a financeirização melhora a liquidez, mas de forma artificial.
“Em um contexto negativo, isto quer dizer que a liquidez está melhorando, mas por meio de um tipo ruim de alavancagem — papéis tratados como ativos que não são lastreados de fato por um ativo, ou ‘circulação de crédito’, conforme chama o economista Ludwig von Mises,” afirmou Long.
Ela ainda descreve um método de criação de valor a partir do vento que, desde a crise financeira de 2008, tornou-se muito familiar.
“O problema é que não há limite teórico sobre quanto ‘papel de bitcoin’ pode ser criado, e papel de bitcoin pode prejudicar a escassez da criptomoeda — isso já aconteceu em mercados de commodities e mercados de derivados de crédito, onde versões de papel de um ativo podem suprimir o valor do mesmo ao prejudicar sua escassez, como ouro e prata.”
Ela acrescentou:
“A maior defesa do Bitcoin é que a maioria das bitcoins estão armazenadas fora da internet, tornando difícil para Wall Street colocar as mãos nelas e consequentemente colocar um funil prático no quanto de financeirização baseada em alavancagem pode acontecer com a criptomoeda.”
Long apontou para o recente incidente ocorrido com a exchange OKEx, descrevendo-o como um exemplo perfeito de como introduzir as criptomoedas à atividades fracionárias de reserva pode dar errado.
“Um bom exemplo é o que aconteceu com a OKEx nesta semana, onde diversos contratos futuros (avaliados em mais de US$400 milhões) causaram uma perda tão grande que ameaçaram a solvência da exchange, pois a perda consumiu todo o fundo de garantia da OKEx, de forma que a exchange foi obrigada a cortar ganhos de seus outros clientes para se manter de pé,” afirmou Caitlin.
Ela prosseguiu:
“Fica claro que a OKEx estava criando ‘títulos’ sem lastro para o bitcoin, caso contrário, isso não teria ocorrido. Uma instituição financeira precisa de um fundo de garantia somente se estiver criando ativos com reserva fracionária. Em outras palavras, uma instituição financeira que está totalmente ‘colateralizada’ — totalmente lastreada pelo ativo do qual ela cria ‘papel’ — nunca precisaria de um fundo de garantia. Interessantemente, a conferência de imprensa da ICE ressaltou que a Bakkt abrirá um fundo de garantia. Então é isso, eles estão fazendo bem embaixo dos nossos narizes.”
A executiva de Wall Street ainda salientou que a reserva fracionária não ocorre somente onde a Reserva Federal cria dinheiro, explicando como a maioria do crédito criado desde 1980 foi feito em mercados de títulos, não no sistema bancário tradicional. O mercado de títulos está na forma de papel para ativos, geralmente empilhados sobre outros papéis, da mesma forma como o crédito bancário funciona.
“E isso é o que pode acontecer com o bitcoin — direitos de papel, empilhados sobre direitos de papel, empilhados sobre mais direitos de papel sobre uma bitcoin real.”
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Long teme que a ICE, proprietária da Bolsa de Valores de Nova York, seja uma figura central na financeirização do Bitcoin e outras criptomoedas, e que os resultados não sejam agradáveis. A ICE lançará contratos futuros lastreados por bitcoins reais, além de um mercado de bitcoin.
Ela não mediu palavras ao tratar das declarações feitas pelo CEO da ICE, Jeffrey Sprecher, declarando que ele não tem um bom entendimento sobre criptomoedas.
“Foi estranho ver ele falando sobre levar confiança e transparência para o Bitcoin, uma vez que a criptomoeda não precisa destas características, pois ela já as conquistou.”
Caitlin explicou que, através da startup Bakkt, a ICE tentará criar liquidez ao construir exchanges para instrumentos financeiros, coletando então taxas e dando colaterais em títulos.
“Eles darão o mesmo colateral diversas vezes, formando longas cadeias colaterais nas quais diversas partes relatarão que possuem o mesmo ativo. Esta é uma das formas através das quais os mercados de títulos engajam em uma forma de serviço de reserva fracionária, e você não tem como detectá-la lendo declarações, pois a contabilidade permite que todas as partes reportem a posse de um ativo — embora haja apenas um ativo!”
Então, é bem sutil. O diabo está sempre nos detalhes dos arranjos de colaterais, e quase todas as casas de compensação que re-hipotecam colaterais estarão interessadas em ver como os planos da Bakkt se saem em relação ao Bitcoin, ela concluiu.
“No geral, detentores de bitcoin têm razões reais para comemorarem a entrada da ICE na esfera. Entretanto, eles têm razões reais para estarem preocupados.”
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Fonte: CCN