A bolha das big techs de IA e o que o futuro lhes reserva

O Diretor de Alocação, Distribuição & Atendimento Estratégico do escritório da InvestSmart XP, André Meirelles, comentou sobre o desempenho das ações de empresas relacionadas à Inteligência Artificial e tecnologia e o que se pode esperar no futuro:
É cada vez mais frequente grandes casas e analistas do mercado afirmarem que haverá uma correção forte e rápida no preço das ações de empresas relacionadas à inteligência artificial e tecnologia. Ou seja, que há uma bolha e que ela vai estourar, muito em breve, de maneira disseminada no setor.
O aumento da probabilidade do fim da festa da liquidez, pós discurso do presidente do FED, Jerome Powell, sobre o último FOMC alimenta essa expectativa. Ele sinalizou possibilidade de interrupção do ciclo de queda de juros na decisão de dezembro – contrariando o mercado, que já precificava 100% de chance de mais uma queda.
A expectativa de uma correção no mercado de tecnologia
A retomada do ciclo de queda de juros nos EUA este ano favoreceu valuations inéditos. NVIDIA, por exemplo, chegou a US$ 5 trilhões de valor de mercado, ou seja, o dobro do PIB do Brasil. Ao mesmo tempo, essas empresas têm planos de investimento agressivos, também da ordem de trilhões de dólares e que serão financiados, em grande parte, com o crescimento do endividamento, em alguns trilhões de dólares. É curioso e preocupante falarmos em trilhões de dólares de modo banal, ainda mais relacionado a um setor tão recente e dinâmico.
Se esses investimentos entregarão os resultados previstos e a conta vai fechar, é uma dúvida, mas é claro que a inteligência artificial, com seu potencial de impactar o crescimento da produtividade, por exemplo, dobrando-a de maneira perene, pode gerar trilhões de dólares a mais na economia. No mais, diversas das empresas do setor têm balanços robustos, entregam resultados, têm margem relevante e crescem faturamento. Ao contrário, por exemplo, das empresas que quebraram na bolha dos Dotcom, no início dos anos 2000.
Mudança estrutural: de software para indústria pesada
Grande parte desses investimentos deve expandir a infraestrutura de processamento de dados, os data centers, e pesa no balanço. O que antes eram empresas de software, como a Microsoft ou marketing online, como a Google – com um modelo mais asset light, mais próximo do setor de serviços – começa a ter um imobilizado mais relevante no balanço, se aproximando do que são os balanços de empresas do setor industrial. O que leva à conclusão natural de que os múltiplos dessas empresas – por exemplo, a relação entre o preço de sua ação e seu lucro – podem estar inflados.
Os múltiplos do setor de tecnologia são muito maiores que os múltiplos do setor industrial, que têm boa parte de seus ativos no imobilizado. Então, pode ser que ocorra uma correção de preço das ações de algumas empresas do setor em função dessa transição de modelo, de serviço para indústria, de asset light para heavy asset – genericamente. O que não necessariamente será rápido, como um estouro de bolha.
Também é importante lembrar que várias empresas de tecnologia já existiam no crash da bolsa da crise do subprime em 2007 e 2008, e tiveram drawdowns relevantes, de mais de 80%, no pior momento, e mesmo assim sobreviveram e conseguiram crescer e prosperar até hoje, mostrando a importância de se manter a racionalidade mesmo em momentos de muito ruído, que podem, inclusive, gerar boas oportunidades.
A virada chinesa e o novo tabuleiro da inteligência artificial
Não se pode esquecer, é claro, do rápido impacto que a DeepSeek causou no preço das ações americanas no início deste ano. Na China, hoje a energia é muito mais barata e sustentável, sendo este um dos grandes gargalos ao uso de aplicações derivadas da Inteligência Artificial. Os data centers, com seus algoritmos, consomem muita energia, então é uma diferença competitiva forte da China em relação aos Estados Unidos. Hoje, cerca de 80% das startups que a Andreessen Horowitz, venture capital baseado em São Francisco, avalia usam inteligência artificial chinesa.
O Airbnb optou por usar a AI chinesa Qwen ao invés do ChatGPT. Fora isso, a retenção das mentes brilhantes de AI na China aumentou, evento derivado dos atritos geopolíticos entre Estados Unidos e China. Essas mentes são fundamentais para o desenvolvimento das tecnologias relacionadas à Inteligência Artificial. Não é à toa que hoje, das 64 tecnologias críticas, a China lidera 57. Era o oposto, cerca de 20 anos atrás. A competição com as empresas chinesas representa um risco para algumas das empresas de AI americanas.
Entre bolha e ajuste: o equilíbrio no setor de AI
Pode ser que seja uma bolha. É difícil dizer se o preço das ações está caro ou não. Cada empresa tem seu modelo de negócio. Difícil saber quem serão os vencedores. Mas imaginar uma bolha generalizada estourando no setor, com o FOMC dando continuidade ao ciclo de corte de juros nos Estados Unidos é pouco provável. Atualmente, o mercado perdeu visibilidade sobre a economia americana, que já sofria a volatilidade dos tarifaços, em um Shutdown que completa quase um mês e meio. Isso dificulta uma avaliação das projeções para os juros americanos de curto prazo. Por enquanto, é tentar aproveitar a festa e ficar perto da porta, mantendo uma carteira diversificada, inclusive dentro de um mesmo setor. Nem todos os modelos de tech e AI sobreviverão ou serão os vencedores. “Um potencial fim da farra da liquidez identifica quem nada pelado”*.
*Expressão do Warren Buffet
