Entendendo criptomoedas: as moedas, a inflação e o sistema financeiro
Para entender criptomoedas, precisamos entender o sistema financeiro
No artigo de ontem, tratamos do surgimento dos bancos centrais, após tratarmos do surgimento do dinheiro impresso. Isso tudo foi necessário para que chegássemos a este ponto: a inflação.
O banco central de cada país tem um papel, que é emitir mais dinheiro lentamente a cada ano, controlando a taxa de inflação. Uma taxa de inflação ideal é de 2% ao ano.
Mas o que isso significa? Se o valor inflacionou 2%, isso significa que a moeda do país passou a valer 2% menos. Ou seja: um real passa a valer 98 centavos. Agora imagine isso de um ano a outro…
É por isso que, quando você pega um encarte de supermercado de 2002, a Coca Cola custava R$2, enquanto em 2019 você compra uma garrafa de dois litros do mesmo refrigerante por R$8. A analogia é com Coca Cola mesmo, faz tempo que eu não bebo e precisava ventilar isso.
De acordo com Jeffery Tucker, economista, o dólar americano não chega a valer quatro centavos por conta da inflação. Esse é o resultado do governo “imprimir” mais dinheiro todo ano. Contudo, o governo não imprime dinheiro “do nada”. Adivinha quem tem um papel fundamental para financiar esse instrumento caindo aos pedaços? Exato, nós.
Financiando a festa
De acordo com Ben Dyson, fundador da Positive Money, os bancos centrais são parte do problema. O problema maior é o poder de imprimir dinheiro que nós damos aos mesmos bancos que causaram a crise financeira de 2008.
Por exemplo, nós guardamos nosso dinheiro no banco e retiramos quando precisamos, certo? Os bancos, então, agem como casas de custódia para o nosso dinheiro.
Claro que não! Nosso dinheiro agora é deles. E uma vez que nosso dinheiro está constando dentro do saldo do banco, eles podem manipulá-lo da forma que quiserem – especialmente criar mais dinheiro. Vamos para um exemplo prático.
Meu saldo no banco é de 100 reais. Desses 100 reais que eu deixei lá, o banco emprestou 97 para outra pessoa, e manteve apenas 3 – mas o saldo ainda diz que ele possui 100. Se você somar os 97 reais que aparecem para a outra pessoa no saldo dela, temos 197 reais criados a partir de 100. Esses 97 reais representam um dinheiro virtual, lastreado apenas pela promessa que essa pessoa fez de pagar de volta. Perceba como isso cria um ciclo.
Ernesto, a pessoa que pegou os 97 reais emprestados com o banco, paga sua dívida. Ótimo. Letícia, que recebeu a dívida de Ernesto, deposita esse dinheiro no banco. E começa tudo de novo. Com os 100 reais que eu depositei no banco, eu alimentei a criação de sabe-se lá quantos reais – todos imaginários. É a famosa reserva bancária fracionada.
Os bancos lucram pelos juros sobre o dinheiro virtual que eles te emprestaram. Simples assim. Eles nem precisam de depósito para criar mais dinheiro mágico e virtual, apenas precisam considerar se alguém é digno de receber um empréstimo.
Recapitulando: boa parte do dinheiro é mágico, criado pelos bancos, o que alimenta um sistema baseado apenas na confiança – confiança na solvência do banco. Confiança de que, se você quiser sacar seu dinheiro, o banco tem liquidez suficiente para lhe dar seu dinheiro.
O que não faz sentido! Se o banco tem, estima-se, apenas 3% do dinheiro que afirma ter, se todo mundo quiser sacar (ainda que uma pequena parte) do dinheiro, os bancos não terão como atender todo mundo.
A crise financeira de 2008 ocorreu por isso. Muita gente pediu empréstimos e os bancos, na esperança de lucrarem sobre os juros, concederam. Porém, esses empréstimos não foram pagos, resultando na crise. Eu vou trazer apenas um número: os Estados Unidos perderam US$16 trilhões em riqueza familiar. Riqueza familiar, percebem? Nosso dinheiro, nossas famílias.
Por que as criptomoedas?
Chegamos na melhor parte. Como vocês puderam perceber, nosso sistema financeiro é absurdamente viciado, baseado em uma confiança que os bancos não merecem.
A inflação é uma realidade, responsável por depreciar moedas anualmente. A inflação é resultado da impressão de dinheiro, atividade controlada pelos governos.
Os bancos captam nosso dinheiro e esticam até onde conseguem, deturpando a quantidade real de dinheiro dentro do sistema.
São exatamente estes problemas que as criptomoedas visam eliminar. Com as criptomoedas, não há intermediário, ou seja, bancos são desnecessários, as trocas são feitas de pessoa para pessoa. Desta forma, não há que se falar em um terceiro esticando nosso dinheiro e distorcendo a realidade do sistema financeiro.
Criptomoedas possuem número limitado. O Bitcoin, por exemplo, só gerará 21 milhões de unidades, divisíveis em até oito casais decimais (conhecidas como Satoshi). Consequentemente, não há que se falar em criar mais dinheiro mágico e virtual, controlando a inflação.
“Mas vou acreditar em uma moeda que são códigos de computador?”, você me pergunta, e era a mesma pergunta que eu fazia. Bom, uma pergunta melhor é: por que não? Nós já acreditamos em um dinheiro virtual criado pelos bancos, manipulado para que eles possam continuar enriquecendo sobre juros. Por que não acreditar em uma moeda cujo valor é um consenso daqueles que a utilizam?
Não sei vocês, mas quando me apresentaram a realidade do sistema financeiro, me pareceu besteira continuar acreditando nele. Me pareceu besteira não procurar outras formas através das quais nós não somos lesados pelos bancos. Agora é com você.
Entendendo o dinheiro, os bancos centrais e o sistema financeiro, você já pode entender o que é Bitcoin. Melhor ainda, você já pode entender o que é blockchain, a tecnologia por trás das criptomoedas que possui aplicação para diversas outras áreas.
A partir de agora, tudo fica mais fácil. Não ignore essa revolução financeiro, ocorrendo bem diante dos seus olhos.