Criptomoedas focadas em privacidade não oferecem tanta privacidade assim

Criptomoedas focadas em privacidade foram feitas para serem privadas. É a razão de ser delas. Se você tirar a privacidade, elas se tornam meras altcoins, e perigosas, com o potencial de tirar o anonimato dos seus usuários e expor seus segredos. Relatórios recentes colocaram em dúvida as ferramentas de privacidade oferecidas por moedas como a zcash e a monero.

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Há segurança nos números

Zcash é uma moeda controversa por diversos motivos, como a “recompensa aos fundadores”, que direciona 20% de todas as moedas mineradas nos primeiros quatro anos a “pessoas interessadas”. A tecnologia que permite que as transações de zcash sejam privadas, a zk-Snarks, é amplamente utilizada por moedas focadas em privacidade da mesma família, como zclassic, zencash e bitcoin private.

O problema com a zcash é que as transações “blindadas” não são habilitadas como padrão. De fato, 85% de todas as transações de zcash são públicas, e algumas carteiras zcash nem mesmo possuem suporte para transações privadas.

zcash
Gráfico de transações privadas de zcash em porcentagem

Quanto menos pessoas optarem pelo anonimato, mais fácil fica para remover o anonimato delas. É por isso que uma rede como o Tor se torna mais efetiva à medida em que mais pessoas a utilizam. Há segurança nos números e, sem as transações protegidas ativadas como um padrão da zcash, aqueles que optam por ativar esta função começam a parecer suspeitos a qualquer um que esteja monitorando o tráfego da rede, como as agências cujas iniciais consistem em 3 letras.

As informações vazadas por Edward Snowden revelaram que a NSA busca e armazena tráfego de rede encriptado, com a lógica de que, se alguém encriptou aquele email, é sinal que essa pessoa tem algo a esconder.

Se o Google tornasse o Gmail encriptado como um padrão, ele entupiria os cabos sub oceânicos grampeados pela NSA com tanta informação indecifrável que removeria todas as suspeitas quando alguém encriptasse algo, o que acabaria com o interesse dessas agências.

A equipe do zcash falou sobre seu desejo em eventualmente tornar todas as transações protegidas como um padrão, embora as palavras “esperamos que um dia isso se torne a regra” sugiram que eles não estão com pressa para implementar estas mudanças.

Most Privacy Coins Aren’t That Private

Anonimato opcional não é anonimato

Dados mostram consistentemente que, quando a privacidade deve ser habilitada, muitas pessoas utilizarão a opção padrão. Além de 85% de todas as transações de zcash serem públicas, 69% de todas as transações de zclassic também não são protegidas. A mesma coisa acontece com a verge, uma moeda focada em privacidade cujas ferramentas para garantir o anonimato foram repetidamente questionadas, fazendo com que a moeda seja raramente usada em transações privadas.

zk-Snarks, a tecnologia que fornece anonimato para as moedas da família-z, é dependente de um sistema que requer que o criador da moeda não retenha uma “chave mestra”. Embora não hajam razões para suspeitar que os times de desenvolvimento tenham feito isso, a questão é que a criptomoeda é livre de confiança, ou seja, ela tira a necessidade de depender da boa-fé de outras pessoas.

A solução mais óbvia para aqueles que querem realizar transações anonimamente é utilizar moedas como a monero, que coloca a privacidade como um padrão. Contudo, até mesmo ela não está livre de problemas.

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Monero não está imune a problemas de privacidade

Preocupações sobre a facilidade com a qual os usuários de zcash podem ter seu anonimato teoricamente retirado têm persistido por algum tempo. A Monero tem sido imune a este tipo de criticismo, entretanto, uma nova pesquisa tem como foco a moeda favorita da deep web.

No documento chamado “Uma Análise Empírica sobre a Rastreabilidade do Blockchain Monero”, pesquisadores de institutos como o MIT expuseram a vulnerabilidade de transações feitas antes da atualização da tecnologia de privacidade da moeda que implementou o Ring Confidential Transactions. Mesmo com as novas ferramentas de segurança, os pesquisadores ainda conseguiam diferenciar as moedas reais das moedas falsas criadas para mascarar as transações em 45% das vezes.

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“Descascando” a privacidade

“Privacidade é um pré-requisito dos Direitos Humanos” é o título do capítulo 6 do livro de Wendy McElroy, The Satoshi Revolution (A Revolução Satoshi). Neste capítulo, ela escreve:

“Para Satoshi, a transparência do blockchain não era apenas para manter o bitcoin saudável, mas para permitir a verdadeira privacidade — uma privacidade que reside em tornar uma chave pública anônima, ao nunca liga-la a uma identidade verdadeira. Em outras palavras, proteger um nome é privacidade. E a primeira linha de defesa para se defender um nome é o anonimato, o pseudônimo ou a polinimia (múltiplas identidades).”

No mesmo capítulo, McElroy cita Satoshi, quando este explica que, com o bitcoin:

“O público poderá ver que alguém está mandando um montante para outra pessoa, mas sem informações que liguem a transação a alguém. Este é um nível de informação similar ao que é liberado pelas Bolsas de Valores, onde o tempo e o tamanho das transações individuais são informações públicas, mas sem informar quem eram as partes.”

Por um tempo, este sistema funcionou bem, com aqueles que desejavam o anonimato fornecido pelo bitcoin aptos a desfrutar desta ferramenta separando sua identidade de sua carteira. Com o passar do tempo, a bitcoin começou a se tornar mais regulada, o que quer dizer que a única forma de comprar moedas era através de uma exchange, que por sua vez requer um nome e um endereço de email, até chegarmos às políticas KYC.

Ao mesmo tempo, as ferramentas de mapeamento de blockchain foram desenvolvidas para facilitar às autoridades vincular identidades virtuais a identidades reais, sendo este um dos fatores que levaram à prisão de Ross Ulbricht (suposto criador da Silk Road).

Conforme Riccardo Spagni da monero disse ao Wired:

 “Privacidade não é algo que você alcança, ela é uma constante batalha de gato e rato.”

Boas ferramentas de privacidade é o máximo que se pode esperar atualmente: suficiente para fornecer anonimato por enquanto, mas talvez não o suficiente para ludibriar uma agência de três letras que detém ferramentas e determinação para identificar um usuário específico.

Utilizar moedas focadas em privacidade, como monero e zcash, ainda é preferível do que não ter privacidade. Contudo, não se deve confiar totalmente nelas para garantir o anonimato das transações. O blockchain viverá para sempre e, caso vulnerabilidades dessas moedas sejam descobertas, toda transação já conduzida que as tenha utilizado estaria em risco.

Fonte: Bitcoin.com

Edição: WeBitcoin