O que pensa o BNDES sobre a tecnologia blockchain?

Diretor de Estratégias e Transformação do BNDES fala sobre blockchain

Ontem, dia 4 de dezembro, foi realizado o Fórum BlockchainGov, uma iniciativa do BNDES com o Instituto de Tecnologia Social (ITS). O objetivo do fórum foi reunir atores do setor público tupiniquim para apresentar e discutir iniciativas em desenvolvimento (ou desenvolvidas) que utilizam tecnologia blockchain e integram os serviços do governo.

Dentre os convidados estavam representantes da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), do ITS Rio, da área de blockchain do próprio BNDES, do Ministério do Planejamento, do Banco do Brasil, da Receita Federal e da Blockchain Academy – que não é um órgão público, mas tem um papel fundamental no processo educacional referente à tecnologia no Brasil.

Todas as apresentações concernentes às participações destas figuras serão devidamente abordadas pelo Webitcoin em outro artigo, pois este será dedicado ao breve discurso introdutório do Diretor de Estratégias e Transformação do BNDES, Ricardo Ramos.

O que marca seu discurso, e talvez esse seja um ponto muito positivo, é o tom leve e não assertivo ao extremo sobre uma tecnologia relativamente nova. Ricardo abre seu discurso explicando como BNDES e blockchain se encontraram. Em 2016, a parte de TI do banco passou por um processo de remodelação (gerado a partir de uma insatisfação de técnicos e gerentes acerca da organização tecnológica do banco), culminando na realização de um hackathon para despertar mais ideias. Daí surgiu, pela primeira vez, a blockchain para o BNDES. E, consequentemente, a relação começou a amadurecer sobre as duas palavras que, segundo Ricardo, são as iniciativas da instituição: inovação interna e transparência.

Nesse ponto, ele faz uma perspicaz observação sobre a falta de flexibilidade da estrutura bancária tradicional:

“O BNDES sempre prezou pela inovação, em discutir com as empresas esse conceito, discutir estratégias. Mas casa de ferreiro, espeto de pau: quando se olhava para dentro, havia pouco espaço para inovar processos, produtos, por vários motivos. O maior deles é porque somos um banco, e bancos são conservadores em sua base.”

Talvez seja esse o ponto que captou minha atenção para o discurso. Eu acabei de ouvir o chefe da área de transformação de um banco voltado ao desenvolvimento dizer que bancos são conservadores, ao começar a falar sobre blockchain. Interessante – e realmente é.

A ideia surgida com o hackathon ganhou propulsão dentro da instituição bancária, onde técnicos de tecnologia da informação se comunicaram com outros setores. Essa movimentação deu origem a um evento realizado em 2017 pelo próprio BNDES, chamado Ideia Lab – “uma ideia para capturar ideias, que não fosse um hackathon, que é muito técnico”, afirmou Ramos. Como resultado do evento, as duas melhores propostas seriam desenvolvidas. Felizmente, uma delas foi a blockchain.

O discurso de Ricardo é ainda mais esclarecedor quando ele menciona o KWF, banco de desenvolvimento estatal da Alemanha, que entrou em contato com o BNDES por conta da iniciativa com blockchain. O fruto desse contato foi uma parceria internacional. Ademais, a instituição brasileira focada em desenvolvimento está dialogando com a Agência Nacional do Cinema (ANCINE), a pedido do Tribunal de Contas da União, que pediu uma maior transparência do segundo órgão – e, aparentemente, o BNDES enxerga a solução para tal questão na tecnologia blockchain. Não só isso, mas Ricardo também falou sobre uma união entre blockchain e Fundo Amazônia – um esforço internacional de conservação da Floresta Amazônica.

O discurso relativamente breve, que tem pouco mais de dez minutos, nos dá um pequeno vislumbre sobre como está a situação do fomento à uma tecnologia tida por muitos como carro-chefe da Quarta Revolução Industrial. É animador ainda saber que, em setembro, foi feita uma consulta pública por parte do BNDES para entender quais soluções baseadas na tecnologia tratada neste artigo estão em alta, para então entende-las a fundo.

Webitcoin: O que pensa o BNDES sobre a tecnologia blockchain?
Ricardo Ramos, Diretor de Estratégias e Transformação do BNDES

Em um ponto onde já estava claro o entusiasmo de Ricardo Ramos, ele usa palavras que repousam muito bem no seio da revolução tecnológica pela qual estamos passando:

“Muito ajuda quem não atrapalha. A diretoria do banco fez o papel dela na questão de inovação, pois o mais difícil em deixar florescer a inovação é não matar a ideia na partida. Talvez não seja a ideia inicial que floresça, mas ela dará frutos e abrirá caminhos. Se você mata a ideia em seu ponto de partida, você não recebe a inovação em sua outra ponta.”

Ele ressalta ainda a importância de incluir o BNDES e demais órgãos públicos em uma mesma rede, responsável por fortalecer o diálogo entre essas instituições em relação a uma “tecnologia portadora de futuro”. Ricardo traçou um paralelo entre o processo realizado pela instituição que representa e o que ele espera que seja feito entre governo e sociedade: um diálogo aberto, que dê margem para o crescimento e inovação, culminando com o Brasil tendo uma “posição de proeminência” neste setor a nível global.

Por fim, ele encerra seu discurso deixando o BNDES a disposição dos outros agentes imersos nessa nova tecnologia, e completa:

“Estamos trilhando um caminho que nós não temos certeza se é correto. A tecnologia vai fazer diferença, mas não temos certeza sobre o caminho a seguir, ainda estamos explorando. Estamos abertos a discussões e parcerias. Estamos nos colocando a disposição de ser um parceiro capaz de agregar valor nesse ambiente e à esta tecnologia. É necessário que haja cooperação e um melhor entendimento das aplicações, e eu acho que esse seminário serve para isso.”

Ainda que a instituição não cumpra à risca o belo discurso feito por Ricardo Ramos, é válido que pelo menos seu discurso se dê em consonância com as autoridades internacionais, em especial as europeias: entender para expandir, e não atrofiar.

É oportuno encerrar o artigo com o que Rosine Kadamani, co-fundadora da Blockchain Academy, disse durante a abertura de sua apresentação:

“Ter um seminário dessa qualidade, com tantas pessoas que estão participando ativamente da construção do ecossistema, pensando a nível governamental a construção de soluções em blockchain me alegra demais. Ver o discurso do Ricardo, como diretor do BNDES, falar abertamente que ele é receptivo à inovação me alegra demais. A sinceridade em dizer que nós não sabemos para onde estamos indo também me alegra demais. O que não podemos ter agora são certezas.”