Opinião: O Bitcoin e a opinião oculta do PT

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Instituto Lula selecionou um marxista para explicar sobre Bitcoin, blockchain e NFTs em curso sobre economia digital. Imagem: Reprodução

Uma visão acadêmica ultrapassada pode induzir vários usuários e militantes ao erro sobre o Bitcoin e tantas outras altcoins

Análise perigosa

Edemilson Paraná é professor adjunto do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC). Também é autor do livro “Bitcoin: a utopia tecnocrática do dinheiro apolítico”; o catedrático tenta explicar se o ativo digital é, de fato, uma ferramenta revolucionária ou apenas mais um mecanismo de especulação.

Em fevereiro deste ano, o Instituto Lula promoveu um curso digital sobre criptomoedas, blockchain e tokens não fungíveis (NFTs). Paraná foi selecionado para transmitir seus conhecimentos a respeito do tema.

Resumo da ópera

Em sua ótica marxista, Paraná acredita que, devido à alta volatilidade do Bitcoin, além de seu baixo volume e pouco alcance, em vez de promover a descentralização pretendida, acaba aumentando a concentração relativa entre os usuários.

Por outro lado, o autor acredita que a tecnologia blockchain pode prover produtos e serviços interessantes à população.

Os equívocos fundamentais

Não é preciso ir muito longe para alcançar os perigos da ideologia marxista sobre análises econômicas. Um dos pontos levantados por Paraná – a “baixa” liquidez – é uma alegação deveras polêmica.

Baixo volume

De acordo com o CompaniesMarketCap, o Bitcoin (BTC) está em 14º lugar entre os ativos mais valiosos do mundo. Seu volume total negociado gira em torno de US$ 368,5 bilhões; um pouco abaixo da Visa (US$ 374,38 bilhões).

Em comparação com o ouro (US$ 11 trilhões), de fato, o Bitcoin ainda é muito pequeno; mas tal comparação, convenhamos, é absolutamente enfadonha e apressada. Estamos falando, afinal, de um dos ativos financeiros mais antigos da história, reconhecido por suas inúmeras características intrínsecas: beleza, maleabilidade e escassez. O Bitcoin tem apenas 13 anos de vida.

Uma coisa é fato: comparado com vários ativos tradicionais e consolidados, o Bitcoin ainda não chega perto em termos de relevância. Por outro lado, diferentemente das principais economias globais – a exemplo do próprio dólar, que enfrenta uma inflação similar à da Argentina – a primeira criptomoeda do mundo apresenta muito mais resiliência ao longo do tempo, pois tem garantido sua fortíssima tendência deflacionária.

Alta volatilidade

A “estabilidade” dos ativos fiduciários é, em grande medida, artificial. Um mês antes do lançamento do real, a inflação chegou a bater 46%. Desde então, o governo brasileiro conseguiu prevenir uma hiperinflação acelerada, mas não foi capaz de enterrar o poder de compra da moeda ao longo das décadas.

Segundo informações do G1, o real perdeu 86,09% de seu poder de compra desde seu lançamento, em julho de 1994. Isso significa que R$ 748,04, dentro do espectro atual, equivale a R$ 100 em julho de 1994, quando o Plano Real foi implementado. Nessa mesma época, um real equivalia a um dólar americano; hoje, US$ 1 equivale a R$ 5,41.

O dólar registrava inflação anual de 1,43%, segundo dados do Official Data. Entretanto, a situação atual é bem mais preocupante: a inflação desacelerou no acumulado de 12 meses, encerrando em agosto de 2022 para 8,3%.

Grande parte das economias reguladas estão enfrentando gravíssimos problemas com a inflação ao longo das décadas. Por outro lado, a unidade do Bitcoin, negociada a US$ 1 em fevereiro de 2011, hoje é negociada a US$ 19.289; mesmo em forte período de baixa, a criptomoeda é incrivelmente mais resiliente que qualquer economia fiduciária relevante.

Descentralização

Se você acredita na definição simplista do Google (uma atividade ou organização controlada por vários escritórios ou autoridades, em vez de um único), sim, o Bitcoin é absolutamente descentralizado.

Se você tem os recursos necessários para minerar criptomoedas, basta empregá-los à construção de uma infraestrutura adequada e começar os trabalhos. Isso não necessariamente vai acontecer se você quiser, digamos, abrir uma franquia; é preciso que os executivos concordem que você faça parte (ou não) do negócio. Isso não existe entre os validadores do Bitcoin.

Felizmente, a mineração do Bitcoin está segura contra um ataque de 51%, que pode ocorrer caso um ator malicioso controle mais da metade do poder computacional da rede. Mas a falha fundamental ainda existe, o que faz com que a criptomoeda não seja totalmente “trustless”.

A ótima marxista de Paraná critica a concentração de capital nas mãos de empresas e indivíduos que têm maiores condições financeiras para garantir maior controle na rede. Acontece que, diferentemente do Estado, o Bitcoin está praticamente “imune” às arbitrariedades de entidades centralizadas. Por esse motivo, dizer que a criptomoeda não é descentralizada não faz o menor sentido.

Conclusão

O instituto petista dificilmente escolheria um professor favorável à liberdade econômica. Um partido que prega a censura contra a imprensa dificilmente renunciará à total mediação financeira da população.

Este artigo é, honestamente, um alerta sobre a visão oculta do PT a respeito de criptomoedas e blockchain. Pode ser que, caso ele seja eleito, não pregue a mesma visão equivocada do acadêmico; mas o realismo é mais pertinente que o otimismo.

Foto de Rafael Motta
Foto de Rafael Motta O autor:

Jornalista, trader e entusiasta de tecnologia desde a infância. Foi editor-chefe da revista internacional 21CRYPTOS e fundador da Escola do Bitcoin, primeira iniciativa educacional 100% ao vivo para o mercado descentralizado. Foi palestrante na BlockCrypto Conference, em 2018.