Opinião: Regulamentações colocam criptomoedas de privacidade em xeque?
Em certos países, criptomoedas que não deixam rastros de negociação foram removidas de exchanges; intervenção estatal criminaliza o direito à privacidade financeira.
“Nada fora do Estado”
Privacidade é uma das grandes vitórias das tecnologias descentralizadas e distribuídas. Mesmo indivíduos que não possuem conta em banco, seja lá por quais motivos, podem fazer uso de criptomoedas para transacionar produtos e serviços diversos.
Contudo, graças à intervenção estatal, ativos digitais focados nessa característica podem encontrar empecilhos legais no caminho.
Como as criptomoedas de privacidade funcionam?
Em linhas gerais, ativos digitais privativos escondem ou mascaram os endereços de suas carteiras. Isso faz com que as transações ocorram de maneira 100% anônima.
Elas são muito importantes para a saúde do ecossistema de finanças descentralizadas (DeFi), pois ajudam a aumentar o nível de eficiência das transações. Além disso, seu nível de criptografia é tão elevado que praticamente anula a possibilidade de transações fraudulentas.
Cripto sob vigilância
O motivo parece simples: sem ter como confirmar a origem do dinheiro, governos ficam preocupados com as declarações de impostos de pessoas físicas e jurídicas. Oficialmente, autoridades afirmam tratar-se da criação de mecanismos de proteção ao consumidor, tendo em vista a natureza autorregulatória do mercado descentralizado.
Em fevereiro deste ano, um regulamento na Coreia do Sul proibiu a negociação da Monero (XMR), um dos primeiros criptoativos do mundo focado em transações anônimas. A questão atualmente se estende a outros ativos privativos, como ZCash e Dash.
O Litecoin (LTC) também está na mira das autoridades sul-coreanas: sua próxima atualização promete implementar a opção de transações anônimas, assim como os criptoativos citados acima.
Segundo a NDTV, o governo indiano não tem intenção de banir os ativos anônimos, mas regulamentá-los. O objetivo seria combater práticas de lavagem de dinheiro, bem como o financiamento de grupos terroristas.
Porém, a negociação de ativos privativos, por definição, não pode ser controlada por governos: se os desenvolvedores renunciassem ao anonimato de seus usuários às autoridades, certamente descaracterizariam a principal funcionalidade de seus ativos.
Por outro lado, as exchanges podem ser pressionadas a compartilhar dados completos das transações realizadas. De toda forma, o governo quer verificar a origem do capital e, com isso, otimizar seus resultados financeiros – ainda que não possua qualquer ingerência sobre desenvolvimento, emissão e controle dos preços.
No Brasil, pouco ou nada ainda é falado a respeito dos ativos de privacidade. Dada a natureza maternal e vigilante do governo tupiniquim, é possível esperar algo próximo do que Coreia do Sul e Índia praticam.
É possível banir criptomoedas de privacidade?
De acordo com Nitin Agarwal, cofundador da plataforma B21, banir ativos digitais anônimos não é uma opção – tampouco algo possível. O executivo afirma que grandes nomes do mercado, como Mastercard, Visa e PayPal, grandes intermediários de pagamentos, abraçaram os ativos digitais e, por conta disso, o interesse dos consumidores a respeito de tais tecnologias tende a crescer.
Tendo em vista que as tecnologias descentralizadas (felizmente) não precisam de autorização prévia do Estado para funcionar, a fala de Agarwal parece trazer algum alívio. Mesmo com um “banimento”, burlar sanções é uma tarefa incrivelmente fácil.
Que fique claro: este artigo, sob nenhuma hipótese, sugere aos caros leitores que assumam riscos desnecessários com o Estado. Porém, mesmo com o banimento, muitos usuários continuarão a negociar ativos digitais sem maiores problemas, a exemplo do que ocorre hoje na China.
De toda forma, seus fundos continuarão seguros. Afinal, não é por meio de uma canetada que seu dinheiro começará a valer mais. Mas pode começar a valer menos devido à incompreensão intencional dos que não querem que você tenha sua liberdade financeira.
Jornalista, trader e entusiasta de tecnologia desde a infância. Foi editor-chefe da revista internacional 21CRYPTOS e fundador da Escola do Bitcoin, primeira iniciativa educacional 100% ao vivo para o mercado descentralizado. Foi palestrante na BlockCrypto Conference, em 2018.